"É
nulo o julgamento no Tribunal do Júri que tenha ensejado condenação quando a
acusação tiver apresentado, durante os debates na sessão plenária, documento
estranho aos autos que indicaria que uma testemunha havia sido ameaçada pelo
réu, e a defesa tiver se insurgido contra essa atitude fazendo consignar o fato
em ata.
De
acordo com a norma contida na antiga redação do art. 475 do CPP, atualmente
disciplinada no art. 479, é defeso às partes a leitura em plenário de documento
que não tenha sido juntado aos autos com a antecedência mínima de três
dias.
Trata-se
de norma que tutela a efetividade do contraditório, que é um dos pilares do
devido processo legal, sendo certo que a sua previsão legal seria até mesmo
prescindível, já que o direito das partes de conhecer previamente as provas que
serão submetidas à valoração da autoridade competente é ínsito ao Estado
Democrático de Direito.
De
fato, existem entendimentos doutrinários e jurisprudenciais no sentido de que
eventual inobservância à norma em comento caracterizaria nulidade de natureza
relativa, a ensejar arguição oportuna e comprovação do prejuízo
suportado.
Entretanto,
não há como negar que a atuação de qualquer das partes em desconformidade com
essa norma importa na ruptura da isonomia probatória, a qual deve ser observada
em toda e qualquer demanda judicializada, ainda mais no âmbito de uma ação
penal – cuja resposta estatal, na maioria das vezes, volta-se contra um dos
bens jurídicos mais preciosos do ser humano – e, principalmente, no
procedimento dos crimes dolosos contra a vida, em que o juízo condenatório ou
absolutório é proferido por juízes leigos, dos quais não se exige
motivação.
Com
efeito, o legislador ordinário estabeleceu, ao regulamentar o referido
procedimento, uma peculiar forma de julgamento, já que os jurados que compõem o
Conselho de Sentença são chamados a responderem de forma afirmativa ou negativa
a questionamentos elaborados pelo juiz presidente, razão pela qual os seus
veredictos são desprovidos da fundamentação que ordinariamente se exige das
decisões judiciais.
Assim,
toda a ritualística que envolve o julgamento dos delitos dolosos contra a vida
tem por finalidade garantir que os jurados formem o seu convencimento apenas
com base nos fatos postos em julgamento e nas provas que validamente forem apresentadas
em plenário.
No caso
de ser constatada quebra dessa isonomia probatória, como na hipótese em
análise, não há como assegurar que o veredicto exarado pelo Conselho de
Sentença tenha sido validamente formado, diante da absoluta impossibilidade de se
aferir o grau de influência da indevida leitura de documento não juntado aos
autos oportunamente, justamente porque aos jurados não se impõe o dever de
fundamentar.
Ademais,
ainda que se empreste a essa nulidade a natureza relativa, na hipótese em que a
defesa do acusado tenha consignado a sua irresignação em ata, logo após o
acusador ter utilizado documento não acostado aos autos oportunamente, não há
falar em preclusão do tema.
Sobrevindo,
então, um juízo condenatório, configurado também se encontra o prejuízo para
quem suportou a utilização indevida do documento, já que não se vislumbra
qualquer outra forma de comprovação do referido requisito das nulidades
relativas."
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