"Na hipótese em que o pedido de registro de desenho industrial
tenha sido formulado quando vigente o revogado Código de Propriedade Industrial
(Lei 5.772/1971) e a concessão do registro tenha ocorrido já na vigência da Lei
de Propriedade Industrial (Lei 9.279/1996), a divulgação do objeto de registro
ocorrida durante o "período de graça" (art. 96, § 3º, da Lei
9.279/1996) não afasta a caracterização do requisito da "novidade",
ainda que não realizado previamente requerimento de garantia de prioridade
(art. 7º da Lei 5.772/1971).
De acordo com o revogado Código de Propriedade Industrial,
encontrar-se-ia o desenho industrial no "estado da técnica" quando
tornado público antes do depósito, perdendo, assim, o requisito da
"novidade", sem o qual o registro não poderia ser concedido (art.
6º).
Excepcionalmente, seria autorizada a publicidade antes do depósito desde
que previamente requerida a denominada "garantia de prioridade",
destinada a permitir que a invenção, o modelo ou o desenho industrial fossem
submetidos a entidades científicas ou apresentadas em exposições oficiais ou
oficialmente reconhecidas (arts. 7º e 8º). A Lei 5.772/1971 foi revogada pela
Lei 9.279, publicada no DOU de 15/5/1996, que passou a vigorar integralmente em
15/5/1997, na forma do art. 243.
A nova lei modificou a definição do "estado da técnica" e,
reflexamente, do requisito da "novidade", que permaneceu sendo
exigido. A "garantia de prioridade", por sua vez, disciplinada nos
arts. 7º e 8º do diploma anterior, foi substituída pelo denominado
"período de graça" regido no § 3º do art. 96 da nova Lei, segundo o
qual: "Não será considerado como incluído no estado da técnica o desenho
industrial cuja divulgação tenha ocorrido durante os 180 (cento e oitenta) dias
que precederem a data do depósito ou a da prioridade reivindicada, se promovida
nas situações previstas nos incisos I a III do art. 12".
Posto isso, surge a seguinte controvérsia: qual a legislação aplicável
para definir "estado de técnica" e o requisito material da
"novidade" na hipótese em que o pedido de registro do desenho
industrial tenha sido formulado quando vigente a Lei 5.772/1971 e a concessão
do registro tenha ocorrido já na vigência da Lei 9.279/1996?
A propósito do tema, a nova Lei dispôs, em seu art. 229, que aos
"pedidos em andamento serão aplicadas as disposições desta Lei, exceto
quanto à patenteabilidade das substâncias, matérias ou produtos obtidos por
meios ou processos químicos e as substâncias, matérias, misturas ou produtos
alimentícios, químico-farmacêuticos e medicamentos de qualquer espécie, bem
como os respectivos processos de obtenção ou modificação, que só serão
privilegiáveis nas condições estabelecidas nos arts. 230 e 231" (redação
original, posteriormente modificada pela Lei 10.196/2001). Desse modo, na situação
em análise, incidirá a primeira parte desse dispositivo - que determina a
aplicação da Lei 9.279/1996 aos pedidos em andamento -, já que o desenho
industrial objeto de registro não se insere nas exceções discriminadas pelo
artigo, relacionadas à patenteabilidade de produtos e processos químicos,
farmacêuticos e alimentícios.
Observe-se que, quando o legislador desejou fosse indeferido o pedido em
andamento que não preenchesse os requisitos materiais da lei anterior, ele o
fez expressamente (vide art. 229-A da Lei 9.279/1996), situação essa que não
ocorre na hipótese em apreço, na qual se deve aplicar a nova Lei.
Não se trata propriamente de fazer retroagir a lei aos casos
consolidados, decididos pelo INPI, mas de reconhecer que cabe ao Poder
Legislativo modificar os requisitos para a concessão de patentes de invenção e
de modelo de utilidade e de registro de desenho industrial e de marca. Assim
como a lei pode modificar, por exemplo, os requisitos para a usucapião antes da
sua aquisição, as hipóteses de retomada de imóveis locados e as regras pertinentes à herança e aos
limites de construção civil (leis de posturas), pode também alterar as
hipóteses relativas à possibilidade de concessão de registro de propriedade
industrial.
Frise-se, de mais a mais, que o STF, analisando o art. 117 da Lei
5.772/1972 (dispositivo semelhante ao art. 229 da Lei 9.279/1996), considerou o
art. 9º da Lei 5.772/1972 - que relacionou as invenções "não
privilegiáveis" - aplicável aos pedidos em andamento quando este diploma
entrou em vigor (RE 93.679-3/RJ, Plenário, DJ de 9/3/1984).
Ora, assim como a lei nova pode restringir as hipóteses de privilégio,
também pode ampliá-las mediante alteração dos requisitos materiais respectivos,
aplicando-as aos pedidos em andamento.
Ante o exposto, nos termos do art. 96 da Lei 9.279/1996, o desenho
industrial, no caso em análise, não se encontra inserido no "estado da
técnica", não estando descaracterizado, por esse motivo, o requisito
material de "novidade".
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