"Mesmo
diante da interposição de recurso de apelação, é possível o imediato
cumprimento de sentença que impõe medida socioeducativa de internação, ainda
que não tenha sido imposta anterior internação provisória ao adolescente.
Cuidando-se de
medida socioeducativa, a intervenção do Poder Judiciário tem como missão
precípua não a punição pura e simples do adolescente em conflito com a lei,
mas, principalmente, a ressocialização e a proteção do jovem infrator.
Deveras,
as medidas previstas nos arts. 112 a 125 da Lei n. 8.069/1990 não são penas e
possuem o objetivo primordial de proteção dos direitos do adolescente, de modo
a afastá-lo da conduta infracional e de uma situação de risco. Por esse motivo,
deve o juiz orientar-se pelos princípios da proteção integral e da prioridade
absoluta, definidos no art. 227 da CF e nos arts. 3° e 4° do ECA.
Desse modo,
postergar o início de cumprimento da medida socioeducativa imposta na sentença
que encerra o processo por ato infracional importa em "perda de sua
atualidade quanto ao objetivo ressocializador da resposta estatal, permitindo a
manutenção dos adolescentes em situação de risco, com a exposição aos mesmos
condicionantes que o conduziram à prática infracional".
Observe-se que não
se cogita equiparar o adolescente que pratica ato infracional ao adulto
imputável autor de crime, pois, de acordo com o art. 228 da CF, os menores de
dezoito anos são penalmente inimputáveis e estão sujeitos às normas da
legislação especial. Por esse motivo e considerando que a medida socieducativa
não representa punição, mas mecanismo de proteção ao adolescente e à sociedade,
de natureza pedagógica e ressocializadora, não calharia a alegação de ofensa ao
princípio da não culpabilidade, previsto no art. 5°, LVII, da CF, sua imediata
execução.
Nessa linha intelectiva, ainda que o adolescente infrator tenha
respondido ao processo de apuração de prática de ato infracional em liberdade, a
prolação de sentença impondo medida socioeducativa de internação autoriza o
cumprimento imediato da medida imposta, tendo em vista os princípios que regem
a legislação menorista, um dos quais, é o princípio da intervenção precoce na vida do
adolescente, positivado no parágrafo único, VI, do art. 100
do ECA.
Frise-se que condicionar o cumprimento da medida socioeducativa ao
trânsito em julgado da sentença que acolhe a representação - apenas porque não
se encontrava o adolescente já segregado anteriormente à sentença - constitui
verdadeiro obstáculo ao escopo ressocializador da intervenção estatal, além de
permitir que o adolescente permaneça em situação de risco, exposto aos mesmos
fatores que o levaram à prática infracional.
Ademais, a despeito de haver a Lei
n. 12.010/2009 revogado o inciso VI do art. 198 do referido Estatuto, que
conferia apenas o efeito devolutivo ao recebimento dos recursos - e não
obstante a nova redação conferida ao caput do art.
198 pela Lei n. 12.594/2012 - é importante ressaltar que continua a viger o
disposto no art. 215 do ECA, o qual prevê que "O juiz poderá conferir
efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano irreparável à parte".
Ainda que referente a capítulo diverso, não há impedimento a que,
supletivamente, se invoque tal dispositivo para entender que os recursos serão
recebidos, salvo decisão em contrário, apenas no efeito devolutivo, ao menos em
relação aos recursos contra sentença que acolhe representação do Ministério
Público e impõe medida socioeducativa ao adolescente infrator, sob pena,
repita-se, de frustração da principiologia e dos objetivos a que se destina a
legislação menorista.
Pondere-se, ainda, ser de fundamental importância divisar
que, ante as características singulares do processo por ato infracional -
sobretudo a que determina não poder o processo, em caso de internação provisória, perdurar
por mais de 45 dias (art. 183 do ECA) - não é de se estranhar que os
magistrados evitem impor medidas cautelares privativas de liberdade, preferindo,
eventualmente, reservar para o momento final do processo - quando, aliás,
disporá de elementos cognitivos mais seguros e confiáveis para uma decisão de
tamanha importância - a escolha quanto à medida socioeducativa que se mostre
mais adequada e útil aos propósitos ressocializadores de tal providência.
Sob
outra angulação, não seria desarrazoado supor que, a prevalecer o entendimento
de que somente poderá o juiz impor ao adolescente o cumprimento imediato da
medida socioeducativa de internação fixada na sentença se já estiver
provisoriamente internado, haverá uma predisposição maior, pela autoridade
processante, de valer-se dessa medida cautelar antes da conclusão do processo.
Em suma, há de se conferir à hipótese em análise uma interpretação sistêmica,
compatível com a doutrina de proteção integral do adolescente, com os objetivos
a que se destinam as medidas socioeducativas e com a própria utilidade da
jurisdição juvenil, que não pode reger-se por normas isoladamente consideradas."
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